19 fevereiro 2009


Eis que borro pedaços de mim em pedaços de pano pregado em pau, pedaços de alma, de carne e de cor, pedaços dos tantos pedaços de outros que sou... eis que é nesses pedaços de tela e vitrine que me faço criança, mulher e deusa, que me faço tão grande de luz e de névoa, tão pequena ante o instinto que por meus leves dedos simplesmente vaza e explode aos olhos de quem o quiser sentir. Numa inquietude que nem mesmo tubos e tubos de tinta poderá conter ou cantar, que vidros e vidros de terebentina não dissolverão, numa folia tão avassaladora que me faz vassala e tão doutora mutuamente. E da mente? pergunto-me, que me vem? que me resta?... e basta que por um instante eu me olhe ali, entre bela e fera, tingida em multiformas e mistérios, para que me venha um grito agudo e aflito: NADA! Porque quem pinta, quem canta, quem dança, quem se invade e explora, da mente nada leva ou traz, na mente não há inspiração, na mente não há poema que faça sentido, não há beleza.

Pedaços, não mais que míseros pedaços de céus e infernos... pedaços eu penduro nas paredes de mundos poucos, e poucos imundos olhos eu lavo, e alguns poucos límpidos e cálidos olhos eu sujo, maculo... tatuo sem dó nem dor... bastam-me a cor, basta-me o som e o tom..

Fragmentos de momentos que fazem da parede de meu quarto um diário, cascalhos de pedra pobre, poeira janela afora voando solta, pra nunca mais... Pedaços do irreal no real.

E disso apenas, não mais nem menos, já me valem vida e morte, já me valem os degraus e os êxtases...


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Um comentário:

  1. E o mais importante é saber receber todos esses sentimentos como dádivas...pedaços, fragmentos de alma. Como é bom nos perceber. Sentir. É tão nosso, é tão todo, é tão particular, é tão público...

    Amei!

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