22 fevereiro 2009

pois é...

Pois é... a gente corre, corre, corre, sem saber pra onde, por que, sem prestar muita atenção, sem intensão, sem muita clareza, sem sequer consciência do próprio ato de correr... a gente passa a infância correndo pra ser logo adolescente, correndo pra superar os traumas, os rompimentos, a pele eesticando, as ilusões, as mentiras e verdades, correndo pra ser logo ouvido, considerado, pra ser logo alguém... passa a adolescência correndo rumo a uma liberdade que nunca vem, e nunca virá, correndo contra o preconceito na escola, correndo pra ter logo a carta, o primeiro namorado, correndo por entre os versos de camões e a prosa poética de lispector, correndo por entre a amargura de dom casmurro e a palidez dos byronianos, correndo pra fugir, pra se achar, pra caber não sei em quê, correndo rumo ao vestibular, ai, corremos tanto, que não damos conta das lindas e problemáticas revoluções, das febris paixões, da ternura e intensidade da idade... e na juventude, corremos com a faculdade, tropeçando pra lá e pra cá, sem saber ao certo o que fazer, corremos e corremos com o peso das notas, das reprovas, das festas, dum inalcansável sucesso acadêmico, na mochila, nos olhos, corremos tanto e tanto com o primeiro estágio, com a monografia, que não dá tempo nem pra uma espiada em Rubem Alves, em Maiakóvski, em Ilda Hilst... ai, correndo e correndo pra ser logo adulto e lançar mão dessa complexidade toda de não ter lugar certo no mundo...
A gente corre corre corre, corre trabalhar pra ter logo um lugar ao sol, pra ter dinheiro, foto na disney, tv de lcd, apto quitado, diploma enquadrado, plástica na ponta do nariz, carro weekend, perfume importado, calça de marca, whisky, bolsa, sapato, mp6... a gente corre, se mata, se encolhe, atrofia, de tanto correr, pelo simples falso-prazer de colecionar coisas... ter ter ter! esgotamos todo nosso tempo, toda nossa força, toda nossa essência, correndo pra ter coisas... coisas!!!! estúpidas, fúteis, imundas COISAS... e corremos tanto pra TER que nos esquecemos de SER, corremos tanto pra conquistar o pc da apple que não dá tempo de perguntar por que vivemos, o que realmente importa, não dá tempo de ver a beleza do mundo, as maravilhas que repousam das minúsculas coisas, nos mínimos detalhes da vida... sacrificamos os finais de semana pra poder ter um casaco a mais no armário, sacrificamos os poetas pra ter um estilista dependurado na etiqueta, sacrificamos os domingos de cachoeira pra satisfazer o ego trocando os dias infinitos de trabalho pela imundície do dinheiro, que trocamos pela terrível e miserável satisfação de comprar.
Nos perdemos tanto em meio a este consumismo todo em que nos lançam, em que nós mesmos nos enfiamos, que já não sabemos o que é viver... nossa felicidade agora mora nos supermercados, nas marcas, nas aparências, e não mais nas pessoas, no bem-estar por dentro... vivemos pela casca que vestimos...
Ultimamente tenho reparado nos comerciais de tv (o slogan do Magazine Luiza é "vem ser feliz"!!!!!!), na minha sede por ter, nas minhas nojentas listas de coisas a comprar, no meu querer infindável de todas as coisas do mundo... as pessoas-formigas andando pra lá e pra cá, nos shoppings, nas escolas, nos terminais de ônibus, nos websites, achando tudo isso tão nomal, tão humano.
E o sonho de liberdade adolescente que nunca chega... o sol tapado com a peneira que nós mesmos criamos, os vários tons de jeans no armário, a etiqueta na blusa na vitrine, fazendo-a valer 300 vezes mais do que deveria, a tecnologia descartável, o ouro comestível, os financiamentos alucinados, os vícios tantos, a sede insaciável, a corrida infindável, a canseira sem tempo, sem onde...
A vida é tão mais que correr e correr... a vida é tão mais que a cerveja que refresca até pensamento, tão mais que a felicidade de comprar no Magazine luiza, mais que o trio completo NET, mais que a bolsa de couro de crocodilo, mais que o carpaccio de aperitivo, tão mais que essa sede que ameniza e acentua a cada ida ao mercado, ao sofá, à rua...
A vida é tão mais que isso...
E eu quero muito mais de mim, dos outros, da vida.

*

Um comentário:

  1. Só uma coisa:
    "Abre aspas":
    "Se o mundo anda tão depressa
    Eu não tenho pressa, vou perder a hora
    Vou perder o sono,vou passar em claro
    Claro que eu não vou passar em branco"


    Ainda bem que pelo menos, às vezes, tentamos não passar em branco perante as horas que passam de pressa...
    Vamos perder a hora Lari?

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